Confuso Decreto sobre o Imposto de Renda faz surgir velha discussão sobre o PAT

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Iniciemos pelo começo. Em 1976, com a intenção de promover aderência ao Programa de Alimentação dos Trabalhadores (PAT), cujo objetivo é melhorar as condições nutricionais dos empregados, em atenção aos art. 1º e 6º da Constituição Federal, criou-se um incentivo fiscal.

A legislação a época foi bastante clara ao prever o direito e a sua respectiva limitação, no sentido de que a empresa, inscrita no PAT, teria o direito de deduzir, do lucro tributável – aquele anterior ao cálculo do IRPJ e da CSLL – o dobro das despesas com o programa. A referida dedução fiscal não poderia ultrapassar isoladamente 5% dos valores destinados ao PAT e/ou cumulativamente 10% do lucro tributável.

Décadas depois, mediante o art. 5º da Lei nº 9.532/1997, o incentivo fiscal relativo ao PAT sofreu ligeiro acréscimo, na medida em que ficou estipulado uma nova dedução limitada a 4% do IRPJ devido. E pronto! Essas foram as únicas disposições legais acerca do tema.

Contudo, em mais de uma oportunidade, decretos executivos tentaram alterar a lógica do incentivo relacionado ao PAT.

Exemplo disso foi o Decreto nº 05/1991 que – indevidamente – alterou toda a dinâmica do incentivo fiscal. O citado diploma normativo, além de transferir a dedução para o imposto de renda devido, transformou o dobro das despesas em “aplicação da alíquota cabível ao imposto de renda sobre a soma das despesas de custeio” relativas ao PAT.

Isto é, a base do incentivo deixou de ser o lucro tributável e passou a ser o montante devido à título de IRPJ e o dobro das despesas tidas com o PAT passíveis de dedução foi brutalmente reduzido para apenas 15% dos gastos com o programa.

Óbvio que os contribuintes espernearam perante o judiciário e este tem dado (até hoje) razão aos choros e gritos. O mencionado decreto de 1991 ofende o tão quisto princípio da legalidade, bem como viola a hierarquia das leis. Qualquer transformação no incentivo fiscal atinente ao PAT tem que vir através da lei em sentido estrito.

De qualquer modo, os decretos não param de ser editados.

Em novembro de 2021, foi publicado o Decreto nº 10.854, que dentre inúmeros aspectos, estabelece que o benefício fiscal referente ao PAT será aplicável em relação aos valores despendidos para os trabalhadores que recebam até cinco salários mínimos e poderá englobar todos os trabalhadores da empresa beneficiária, nas hipóteses de serviço próprio de refeições ou de distribuição de alimentos por meio de entidades fornecedoras de alimentação coletiva; e deverá abranger apenas a parcela do benefício que corresponder ao valor de, no máximo, um salário-mínimo.”

Em outras palavras: o decreto inova. Inova muito e restringe questões que não tem competência. Não à toa os tribunais federais regionais do país têm deferido liminares e as confirmado em sentença, de modo a obstar os recortes no mencionado incentivo fiscal, conforme dita o Decreto nº 10.854/2021. O motivo do deferimento permanece o mesmo de anos atrás: princípio da legalidade e observância à hierarquia das normas.

Considerando que o Decreto está em vigor, a demanda judicial se faz necessária. A boa notícia é que não se incorre em honorários sucumbenciais, seja porque a discussão se dá através de Mandado de Segurança, seja porque o mérito da discussão resta resolvido. Decreto não pode inovar texto legal.

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